Água potável, recurso natural finito
- Tabahyba
- 20 de jul. de 2023
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Chegou a vez de falarmos sobre o ODS 6, que visa assegurar a disponibilidade e gestão sustentável da água e saneamento para todos. Algumas palavrinhas são importantes e devem ser por nós destacadas deste objetivo específico. São palavras que expressam conceitos fundamentais que estão indissociavelmente interligadas: disponibilidade, gestão e sustentabilidade.
A sustentabilidade é a ideia que norteia a disponibilidade e a gestão dos recursos hídricos que tenha como meta a universalização desde bem precioso para a preservação da vida no planeta. Isso porque se trata de um produto finito e que, justamente por isso, em breve se tornará indisponível para as pessoas e para a natureza que dela se retroalimenta caso nada seja feito.
Por outro lado, sem uma gestão sustentável desses recursos, o desperdício e o aumento dos custos da captação e distribuição em pouco tempo fariam com que apenas alguns privilegiados tenham acesso à água potável, o que além de ser contrário a um acesso à água e saneamento “para todos”, perpetua as desigualdades que são o alvo do ODS 10.
Niterói possui uma história riquíssima sobre a gestão e disponibilidade da água potável para a população, dispondo atualmente de rede de água encanada em 100% das suas residências segundo os dados do Instituto Água e Saneamento. A média do estado do Rio de Janeiro é de 90,54%, e do país 83,96%.
Acontece que Niterói mantém ainda hoje bem preservadas as estruturas históricas de um dos primeiros sistemas de captação e distribuição de água para a sua população do Brasil, na chamada “Chácara do Vintém”.
Até meados de 1820, o centro da Vila Real da Praia Grande – como se chamava Niterói – contava basicamente com uma única fonte pública localizada quase em frente à igreja de Nossa Senhora da Conceição. Ela fornecia cerca de 800 barrís (cerca de 12.770 litros) de água por dia, escoando na direção de um largo que já não mais existe chamado “Campo Sujo”, que ficava próximo onde hoje está a Praça da República. Mesmo havendo outras três fontes d’água, uma na Boa Viagem, outra no Ingá e outra na Armação, ali naquela região mais central, populosa e com o comércio mais desenvolvido, esse sistema de abastecimento estava longe de ser suficiente.
Fora as tais fontes públicas, a água era vendida pela cidade em carros-pipa de uma fonte pertencente ao comendador José de Andrade Caetano Pinto, proprietário da Chácara do Vintém, de cuja nascente a água era retirada. É bem possível que o caminho que hoje existe dentro da chácara coberta pela vegetação e que sobe até bem próximo ao poço mais alto era o antigo caminho utilizado pelas carroças-pipas do comendador, carregadas pelas ruas por mãos escravizadas. Elas eram abastecidas e dali seguiam pelos logradouros ofertada de casa em casa pelo preço de 40 a 100 réis o barril. Quarenta réis era o mesmo que dois vinténs, e cem réis o equivalente a um tostão.
Com o adensamento populacional da cidade ocasionado pela vinda da Família Real em 1808, que empurrou parte da população do Rio para este lado da Guanabara, além do consequente desmatamento que atingiu os mananciais e nascentes para o plantio dos cafezais e a construção das casas e o abastecimento das indústrias com carvão, a única alternativa para o abastecimento público da cidade era através da construção de um aqueduto partindo da Chácara do Vintém. Após muitas reclamações, em 1831 as obras foram iniciadas. Em 1837 já estavam prontos o açude, as duas caixas de decantação, os “telhões” e os dez primeiros arcos de alvenaria do aqueduto que ainda se encontram no local para visitação.
Entretanto, o incremento da população e o desmatamento não pararam neste período, muito pelo contrário, e tais medidas se tornaram ineficientes. Foi quando surgiu naquele mesmo ano a necessidade da desapropriação das nascentes da chácara do comendador Andrade Pinto, por 6 mil contos de réis. Depois de algumas idas e vindas, a Chácara do Vintém foi desapropriada pelo decreto nº 172, de 1840. E mesmo assim, não foi suficiente. E não será suficiente enquanto o modelo não for sustentável.
Ainda em 1846 foi cogitado o uso do manancial do Rio da Vicência, mas isso só se tornou realidade na década de 1860. No final do século XIX, houve a pouco efetiva contratação da Companhia Melhoramentos Urbanos de Nictheroy em 1885 (depois Empreza de Obras Publicas no Brazil); a alternativa encontrada para a persistente falta d’água foi a canalização das águas que desciam da Serra dos Órgãos para Niterói. Isso foi feito finalmente em 1889 pela Companhia Cantareira e Viação Fluminense. Este foi o início da decadência do antigo sistema da Chácara do Vintém.
Em suma, vale à pena um passeio pelas estruturas históricas do aqueduto da Chácara do Vintém, inseridas dentro dos limites da Unidade de Conservação Integral – UCI –, Parque Natural Municipal da Água Escondida. Passeio que ilustra e educa sobre o risco do desabastecimento de água potável diante dos impactos negativos causados pelo homem ao Ambiente natural e urbano. Precisamos pensar em Impactos Positivos, uma Cidade Inteligente que realmente pense no uso sustentável e democrático deste recurso fundamental PARA TODOS.
Henrique Barahona
Sócio Fundador Tabahyba, Casa de Todos